segunda-feira, 5 de abril de 2010

ladies and gentlemen, we are floating in space



Esse disco é daqueles que fala com você de diversas maneiras. Da melancolia ao rancor, da paranóia à segurança, da ansiedade à tranquilidade. Jason Pierce escreveu sua única grande obra-prima com esse disco de 97, uma espécie de tour-de-force noise/gospel que de uma forma arrebatadora transformou a cena do britpop.

Naquele ano, o Oasis abusava da psicodelia, o Blur partia pra um noise mais anárquico, e o Verve e o Pulp faziam canções que, mesmo com toda sua roupagem moderninha, ainda mantinham fidelidade ao rock britânico sessentista. Não foi o caso com o Spiritualized, que pariu (sim, foram dois anos gravando) 12 classicões que, como a capa sugere, devem ser não apenas ouvidos, mas ingeridos, como boletas tarja preta, daquelas que levam nossa consciência ao inconsciente, o ego ao superego, como num pêndulo oscilando entre a fúria e o delicado, entre a amargura e o êxtase, o amor e o ódio.

E só pensando em dualidades é possível compreender como este disco flui. Pode ser uma súplica ao perdão de um amor perdido, ou mesmo um atestado de superação de um coração partido; Mas quem não disse que pode ser também a ânsia por mais uma picada de heroína, mais uma dose de whiskey, ou um momento de tranquilidade do viciado perdido que se livra da dependência e encontra-se novamente? As interpretações são várias, mas a dualidade persiste.

Jason Pierce nega, mas é facílimo remeter as letras do disco ao fim do seu romance com Kate Radley, que era sua tecladista e o chifrou com Richard Ashcroft (líder do Verve). O verso "All I want in life's a little bit of love to take the pain away", é repetidamente sussurado por Pierce na faixa-título enquanto outros loops repetem versos que remetem à superação de um daqueles "fracassos existenciais" da vida. Dorzinha de corno desgraçada hein? Ironicamente ou não, é a voz de Kate que sussurra "Ladies and gentlemen, we are floating in space" no início da música, como se dissesse que não faz diferença se importar com o amor, com a dor, com a felicidade - afinal nada somos além de massas inertes flutuando num espaço sem fim.

Eu podia falar mil coisas sobre cada canção desse disco e o quanto elas encontram identificação em qualquer merdão nos seus vinte e poucos anos. Desses que, arrasados com suas decepções amorosas, existenciais, profissionais e que, sem muitas perspectivas, buscam nas drogas um alívio para suas nóias. Com 70 minutos de duração, o disco se infiltra na alma de quem ouve e convida-nos a essa viagem, esse egotrip que não é só do Jason Pierce: é de todos nós com um coração pulsante e com aquela porcaria arregaçada e problemática na cabeça que chamamos carinhosamente de cérebro. Ladies And Gentlemen We Are Floating In Space é, acima de tudo, um álbum de empatia e, uma vez conectado a ele, largá-lo é tão difícil quanto largar o pico.

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